sexta-feira, 8 de dezembro de 2006

Ruy Belo

(...)
O que dirá de mim o castanheiro do outono

a estação do que passa e se desfaz

Esqueci a minha infância e não sei nada

Estou à sombra e espero alguém virá

sombria melodia do meio-dia

o perfume dos campos cavalgados

na quente luz do dia em que eu vivia

Alguém me chegará desse distante bosque

onde eu errei a minha juventude

nas formas levemente tacteadas pelos dedos

Não me demoro ou moro em sítio algum

já nada significam as palavras

neste deserto onde vigilo e estou desperto

terrivelmente só dentro da noite.Ali

no silêncio profundo da floresta ao

teu singular olor de singular mulher

crucifiquei a minha juventude

A vida tem aspectos criminosos como

a subida da chama silenciosa na hasta da mulher que se

procure

Não há nenhum regresso nos meus passos

a lua era outra lua de hora a hora

a natureza espera-me faz-me sofrer

troncos incendiados no outono

depois adormecidos no inverno

o aspecto humano de uma terra cultivada(...)

Excertos de Despeço-me da Terra da Alegria, in Obra Poética de Ruy Belo, vol 2, Editorial Presença, 2ª edição, Lisboa, 1990

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